segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Uma bela noite de aulas quando eu frequentava a Escola Secundária da Cidade Universitária, o meu Professor de História comunicou-nos todo orgulhoso que iríamos ter o privilégio de conhecer pessoalmente o Professor Agostinho da Silva. Infelizmente na semana seguinte, inicio de Abril de 1994, Agostinho da Silva viria a falecer e logicamente nunca mais me esqueci da infeliz coincidência.

Aqui há uns dias falei com um jovem que frequenta actualmente o 12º ano, sobre Agostinho da Silva. Ele nunca tinha ouvido falar em semelhante pensador.

Infelizmente há pessoas de grande valor cuja obra começa por ficar desfocada com o decorrer dos anos até que se perde no tempo e se extingue como se de um velho bilhete de metropolitano se tratasse...

Resolvi então usar o meu Blog para de alguma forma colmatar essa lacuna.



Mensagem aos Portugueses

"O que quero de todos os portugueses é o seguinte: sejam curiosos; e que a organização em sociedade possa ser de tal maneira que eles possam satisfazer essa curiosidade completamente. E não para ganhar dinheiro, não para fazer figura, nem para ganhar cargo, mas para ser plenamente aquilo que é. Alguma coisa que ele sinta que o está desenvolvendo na mensagem única que tem que dar do mundo, de maneira que a minha mensagem para qualquer aluno de qualquer escola é: faça favor de cuidar da sua mensagem e não da minha. A minha foi, é só para dizer «cuide da sua», porque essa é que tem importância. E a mensagem será vossa na medida em que for o mais diferente possível da minha, ou de qualquer outra. Senão, para quê duplicados no mundo? Não é preciso. Para isso é que inventaram os carimbos. Eu não sou um carimbo de ninguém. "

Agostinho da Silva, in 'Entrevista'



BIOGRAFIA



[por Romana Brázio Valente]

1906 – Filho de Francisco José Agostinho da Silva e Georgina do Carmo Baptista da Silva, George Agostinho Baptista da Silva nasce no Porto a 13 de Fevereiro.
1906 (Agosto/Setembro) – Muda-se para Barca D’Alva, onde vive os primeiros da sua vida
1912/1913 – Regressa ao Porto. Como já sabia ler e escrever, a mãe inscreve-o no ensino primário (Escola de São Nicolau)
1913 – Faz o exame de primeiro grau e fica distinto
1914 – Faz o exame da 4ª Classe e ingressa na Escola Industrial Mouzinho da Silveira
1916 – Ingressa no Liceu Rodrigues de Freitas
1924 – Entra para a Faculdade de Letras do Porto para cursar Românicas mas, transfere-se, no mesmo ano lectivo, para Filologia Clássica
1928 – Termina a sua licenciatura e passa a colaborar na Revista Seara Nova
1929 – Defende a sua dissertação de doutoramento a que dá o nome de O Sentido Histórico das Civilizações Clássicas
1930 – Frequenta a Escola Normal Superior de Lisboa
1931 – Parte para Paris, como bolseiro, e estuda na Sorbonne e no Collége de France
1933 – Regressa a Portugal e é colocado no Liceu de Aveiro como professor, onde lecciona durante dois anos
1935 – É demitido do ensino oficial por não ter assinado a Lei Cabral (obrigatória para todos os funcionários públicos)
1935 – Consegue bolsa do Ministério das Relações Exteriores de Espanha e vai estudar para o Centro de Estudos Históricos de Madrid
1936 – Regressa a Portugal devido à iminência da Guerra Civil Espanhola
1938 – Abandona a Revista Seara Nova
1939 – Criação do Núcleo Pedagógico Antero de Quental
1940 – Elaboração de Iniciação – Cadernos de Informação Cultural
1943 – É preso pela PVDE na Prisão do Aljube
1944 – Abandona Portugal e parte para a América do Sul. Entra pelo Rio de Janeiro e depois dirige-se para São Paulo
1945 – Abandona o Brasil e instala-se no Uruguai
1946 – Vive na Argentina
1947 – Regressa definitivamente ao Brasil. Instala-se em São Paulo mas, em seguida, fixa-se na Serra de Itatiaia
1948 – Abandona a Serra e instala-se no Rio de Janeiro. Nesta cidade, trabalha no Instituto Oswaldo Cruz (dedicando-se ao estudo de entomologia), ensina na Faculdade Fluminense de Filosofia e colabora com Jaime Cortesão, na Biblioteca Nacional, no aprofundamento da obra de Alexandre Gusmão
1952 – Integra o corpo docente da Universidade de Paraíba (João Pessoa) e lecciona também em Pernambuco
1954 – Participa, ao lado de Cortesão, na organização da Exposição do 4º Centenário da Cidade de São Paulo
1955 – Ajuda a fundar a Universidade de Santa Catarina
1959 – Criação do Centro de Estudos Afro-Orientais (CEAO) e ensina Filosofia do Teatro na Universidade da Bahia
1961 – Torna-se assessor para a política externa do Presidente Jânio Quadros
1961 – Regressa fugazmente ao Rio de Janeiro e a Santa Catarina, porém, ruma para Brasília
1962 – Colabora na fundação da Universidade de Brasília e cria o Centro de Estudos Portugueses na mesma Universidade
1963 – Equiparado a bolseiro da UNESCO, visita o Japão. Em Tóquio dá aulas de português. Aproveita a sua ida ao Oriente para conhecer Macau e Timor. No mesmo ano vai aos Estados Unidos da América. Regressa posteriormente ao Senegal.
1964 – Assenta moradia entre Cachoeira (no recôncavo baiano) e Salvador ( onde congemina a formação do Museu do Atlântico Sul no Forte de São Marcelo). Em Cachoeira funda a Casa Paulo Dias Adorno que, para além de ser um Centro de Estudos (extensão do Centro de Brasileiro de Estudos Portugueses da Universidade de Brasília), é também uma escola
1969 – Avesso a ditaduras, sai do Brasil em 1969 e regressa ao seu pais de origem
1969-1994 – Num Portugal onde reina uma primavera marcelista, devota-se essencialmente à escrita. Mais tarde, e já depois da Revolução dos Cravos, Agostinho regressará ao ensino: universitário por título honorifico e particular e informal na sua casa do Príncipe Real. Nessa altura é reformado pelo Governo Brasileiro. Só uns tempos depois, o Governo de Portugal lhe restituirá os retroactivos concernentes aos anos da Ditadura. Contudo, e despreocupado com a questão financeira, viaja, escreve, recebe medalhas e títulos, participa em programas de televisão, é reconhecido filósofo popular, mas, na sua perspectiva, é o tempo em que se ocupa da sedimentação da futuridade da Era do Espírito Santo
1994 – Morre em Lisboa a 3 de Abril.

Poesia Portuguesa: Agostinho da Silva



Dizendo que é só amor
fazes Deus menor que Deus
cercas o ilimitado
dos limites que são teus.
Deixa de estufar o peito
quando fazes tuas rondas
talvez teu cérebro seja
só um bom detector de ondas.
Do que é o Espírito Santo
só diga quem fique mudo
que palavra há que me leve
àquele nada que é tudo.
E venha filosofia
teologia que farte
o que se pense de Deus
é só de Deus uma parte.
Nunca voltemos atrás
tudo passou se passou
livres amemos o tempo
que ainda não começou.
É só bem dentro de nós
que o projeto se anuncia
se retoma se reforma
e se volta à luz do dia.
É o mundo que nos coube
perpétua ronda de amor
do criado ao incriado
por sua vez criador.
Mais longe estás se houve início
mais perto se o tempo finda
e a rosa que em ti abriu
é em mim botão ainda.
Mais que a teu Deus sê fiel
ao que tu sejas de Fé
talvez o Deus que te crias
oculte o Deus que Deus é.
Mais que tudo quero ter
pé bem firme em leve dança
com todo o saber de adulto
todo o brincar de criança.
O mundo é só o poema
em que Deus se transformou
Ele existe e não existe
tal a pessoa que sou.
Todo momento que foge
a eternidade encerra
só atingirás o céu
por cuidado passo em terra.
Talvez seja isto somente
o de mais perfeito ensino
ter homem a liberdade
de se entregar ao destino.
Divino espírito santo
senhor do imprevisível
me toma pois da verdade
só quero o que for incrível.
Como durmo sossegado
sabendo que por mim vela
uma coisa que sonhando
vivo me tem dentro dela.

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